terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Molde

Na bolsa estavam apenas o celular, meu perfume e um chiclete. Eu comprei o presente na sexta mas não entreguei nem no sábado, estava complicado.
Esperei até as três para decidir se ia, cheguei atrasada e me enfiei no primeiro vão que encontrei livre. Não bebi, falei mal de dois ou três vestidos apenas e dancei até quase perder os pés, torcendo pra não acabar nunca aquilo de ser uma pessoa nova, que usa vestidos finos e salto miúdo enquanto se sente olhada pelos lados "como ela ficou diferente".
É bom destoar. Enquanto os outros discutiam as noites anteriores e lembravam coisas de longos anos e disfarçavam o grande absurdo de tudo no mundo segurando o copo e tiravam milhares de fotos do amor possível eu só me obrigava a conseguir equilibrar a verdade de ser quem sou sobre a sandália de cetim.
Os olhos ficaram bem maquiados pela leveza de quem não quer mais nada dessa vida além da própria vida animada no sábado à noite, a leveza de quem nem ia sair e nem faz questão nenhuma de ser amado ou desejado ou mesmo notado e pode ouvir a música e seguir o som sem se esconder, esperar ou convidar.
Foi bem fácil, ao contrário do que eu pensei, fazer de conta que pra mim tudo aquilo era normal e lindo e que eu estava à vontade segurando a bolsa em que não cabia quase nada.
Quem me viu, viu apenas a mocinha com o cabelo modelado com mousse e a pele queimadinha e o vestido não muito acima do joelho, a mocinha que não se importava em chegar sozinha e dar tchauzinho pra conhecidos e rezar um pouco e não usar vestido branco nem muito estampado e manter o salto até o fim. A mocinha que troca ideias intelectuais ou sentimentais segurando um copo d'água. Ninguém suspeitou que, naquela noite, a mocinha se sentia pela primeira vez na vida, uma pessoa digna de ser "um amor" pro mundo ou  só pra alguém.
Eu sorri bastante e nem me importei com cabelos que se desfaziam, maquiagens que se derretiam, imperfeições que se deixavam ver ou nomes trocados. Eu me apertei inteira e fui educada, simpática e discreta. Eu não sobrei, não faltei e nem fiquei sentindo faltas ou excessos de pessoas ou sentimentos. Eu queria caber sempre tão perfeitamente em mim.