sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Pedaços

Lá se foi meu cabelo.
Eu fiquei tantos anos esperando que ele batesse no quadril, tantos anos planejando o que eu faria quando ele fosse enorme mesmo. E quando chegou eu fui lá e cortei. E cortei um monte de coisas e até pessoas.
Aí quando tirei as raízes de tudo e clareei o cabelo e até a alma, resolvi plantar coisas novas... que agora crescem também, e vão tomando suas próprias formas a cada dia. É bom.
E meu pescoço anda tomando mais sol também. Eu inteira ando tomando mais sol. E nem estou detestando tanto assim. Acho que, de repente, pode ser sintoma disso que falam que acontece quando você sabe que tem andado pelo caminho certo.
E eu acho que tenho feito isso mesmo, por mais que isso me soe dizer que poxa, eu sei onde estou e isso é estranhíssimo pra uma pessoa que mal aprendeu o próprio nome até hoje.
Aquelas ânsias de que eu sempre falo têm sido mais amenas - quer dizer, elas não passaram, mas agora me dão por outros motivos, que são até bons, no fundo - e nem estou abafando tantos gritos quanto fiz a vida toda. A respiração também está falhando menos.
Depois que eu fui lá e cortei as pontas duplas do meu cabelo, a vida foi lá e cortou as pontas duplas das minhas escolhas, o que quer dizer que finalmente consigo ver algumas certezas se aproximando, mesmo que ainda não possa agarrá-las.
Ninguém se surpreende quando eu digo pra onde vou. Ninguém ri e nem acha maluco.
Acho engraçado, porque eu mesma acho maluco demais, mas sei lá... de repente eu nem estou mais tão fora da realidade assim e o mundo é mesmo bem mais maluco que eu.
No fundo, todo mundo sempre soube.
E eu, mesmo achando maluco, nunca estive tão segura de outra coisa na vida! No fundo, eu sempre soube mais que todo mundo. No fundo, eu sei dos bons ventos que me levam e pra onde eles me levam.
Eu já saí do meu emprego, já fiz minha lista de bagagem, já tenho os documentos todos e máquina fotográfica e vontade e já até chorei também.
Falta tão pouco pra tudo que eu queria que eu nem sei se choro mais ou me belisco.
E isso é bom, embora eu saiba de todas as renúncias embutidas nessa coisa toda, embora eu entenda de todos os pedaços meus que estão ficando pra trás.
É que sinto de algum jeito que isso tudo é pra pegar o melhor deles.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Já antes

Eu sinto saudade de você, sabe?!
Saudade quando a gente não se fala. Saudade quando acontece uma coisa muito sem cabimento de alegria ou de tristeza e você não está do meu lado. Saudade quando eu quero te mostrar a roupa nova que eu comprei ou o bolo novo que aprendi a fazer.
É saudade de saudade mesmo. Daquelas que esmagam o coração e parece que a gente vai chorar só de pensar. Parece saudade de verdade mesmo.
É saudade dos toques, dos cheiros, das nossas risadas. Saudade de te abraçar ao chegar em casa, de rir no teu peito das besteiras que a gente fala, saudade de me arrumar enquanto você me espera pra sair, de estourar pipoca pra hora do jogo, de te fazer massagem pra dor nas costas, de acordar sem tem dormido.
Eu sinto saudade de você.
E não vou dizer que não é bem estranho. Saudade a gente sente de coisas que a gente teve. E o que não? E de você?
Eu sinto saudade de você, como se fosse algo que tivesse sido meu e não é mais.
Ontem eu estava deitada, sabe, me concentrando na respiração pra dormir como aprendi a fazer sozinha pra não perder horas e horas de sono toda noite. E aí eu fico muito quieta pensando no ar que entra e sai do meu nariz e é como se ele entorpecesse o resto de mim e eu presto tanta atenção nele que é sempre nessa parte que eu durmo.
Mas aí ontem você estava lá. Ficava rindo do quanto eu sou estranha às vezes e do meu dedinho do pé cruzado pra me salvar de alguma coisa. Ficava falando bobagem pra eu dar risada e aí tirar sarro porque minha risada é escandalosa. Ficava me fazendo carinho no cabelo e explicando porque é que eu não tinha que ser tão ansiosa e nervosa e maluca. Você é leve mesmo.
E aí me deu tanta saudade... e não dava pra dormir com aquilo tudo, eu fico feliz demais com essa saudade toda, acorda muita coisa que eu tinha esquecido como era e aí é que eu não durmo.
Hoje eu acordei com o rosto inchado de um choro que eu não tive durante a noite. Eu não dormi e nem chorei, fiquei olhando pela janela e pensando em como a nossa saudade é a pior e a melhor do mundo todo. Eu acordei com o rosto inchado de sorrir demais.
Eu me acostumei com a sua presença nos meus dias e nas minhas noites.
Eu nunca vou te perguntar onde você estava. Eu fico muito feliz quando é aqui que você está. Eu sinto saudade e é uma saudade de coisas que ainda serão. Você me disse isso um dia e eu entendi na mesma hora que era isso essa coisa que eu sinto.
Eu fico comendo e trabalhando feito louca e me afogando em Coca-Cola e achando tudo lindo e depois tudo feio, eu fico pensando e falando e achando que to ficando louca mas, no fundo mesmo, é só saudade de você.